"Naquele dia pari-me”. É desta forma que a protagonista de “Cai a Noite em Caracas”, o romance de estreia de Karina Sainz Borgo (Alfaguara – Penguin Random House, 2019), sintetiza a metamorfose que vivenciou. A obra conta a história de Adelaida, que, para abandonar a realidade que a esvaziava de si própria, preparar a fuga de uma Venezuela entregue ao caos e à morte e, como diz, parir-se, tem de assumir a identidade de uma cidadã espanhola falecida. Tratou-se – efetivamente – de um segundo nascimento, não apenas de uma renovação de pele.
Adelaida desnasceu, num processo inexorável de desumanização que a empurrou para a franja do humano: enterrou a mãe, perdeu a casa, temeu pela vida, roubou a comida, o teto, o dinheiro e a história a um cadáver. A isto foi obrigada pelo contexto, vivendo num país dominado por um ditador, com as ruas a saque, onde imperava a violência e a extorsão, e sem acesso a bens de primeiro necessidade vendidos no mercado negro.
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14/10/2019 às 17:43